2022 veio com um gostinho de “quero escrever muito”. É tão gostoso ter um respiro e sentir que a vida pode voltar a fluir de maneira mais leve, com uma produtividade boa.

Eu vivenciei coisas bastante interessantes nesse fim de ano e achei que essas experiências valiam um textão. Hoje quero falar sobre preconceito e normalização de situações que podem gerar crenças.

Para quem me lê há anos, não é novidade que tenho alopécia androgenética. Recebi o diagnóstico aos 18 anos e passei a vida sofrendo e lutando com a situação dos meus cabelos. A sociedade faz uma forte ligação da feminilidade às madeixas. Revistas bombardeavam mulheres com dicas da preferência masculina por fios longos: até o nosso cabelo era/é sexualizado.

Depois de muito sofrer e amadurecer, em 2018 comecei a usar lace – um tipo mais “chique” e elaborado de peruca – e, em 2020, raspei os meus fios porque estavam caindo demais e aquilo estava me deixando bem mal. Raspar o cabelo foi uma libertação gigantesca, devo dizer.

Hoje, tenho mais de 11 laces. Cada dia uso um cabelo: combino com a roupa, com o meu humor ou o que me der vontade. Não tenho essa de usar a lace como se ela realmente fosse minha, como se ninguém pudesse saber que uso, pelo contrário. Falo abertamente sobre o tema, converso com as pessoas, desmistifico pensamentos e faço a minha parte tentando normalizar o assunto.

Como normalizar um tabu para crianças

Nesse Natal de 2021, algo curioso aconteceu: reparei que, tanto para os filhos dos meus amigos, quanto para as crianças da minha família, o fato de eu usar lace era absolutamente normal. “Ela tira e põe o cabelo na hora que ela quer”, contou o Lorenzo (4 anos) para uma amiga nossa. E emendou: “o cabelo dela é curtinho”.

Ele sabia que o meu cabelo era o curto e que eu tinha muitos cabelos diferentes. Eu nunca disse nada para ele. Nunca sentei e expliquei ou conversei: essa foi uma conclusão dele baseada em pura observação. Cada dia que vou à casa dele, estou com um cabelo e seu olhar atento captou tudo! As crianças aprendem por pura e simples convivência: aquilo que, muitas vezes é um tabu para muitos, para eles se torna normal se você age e trata como normal. O Lorenzo não acha que eu ter cabelo curto e, cada dia estar com um cabelo diferente é um problema: para ele aquela é a minha realidade, é normal. Da mesma forma, é também normal a mãe dele estar com o mesmo cabelo todos os dias!

Outro exemplo foi em um dia de Natal que estava na chácara com as crianças da minha família e fui entrar na piscina. Vou relembrar meu diálogo com a Helô, de 5 anos:

– Você vai entrar na piscina com esse cabelo ou vai tirar?

– Vou tirar. Não gosto de nadar com este cabelo porque pode estragar e é desconfortável.

– É legal que você pode tirar e colocar quando quiser, né?

– Exatamente! Eu tiro e coloco quando quero!

Veja como, para ela, era absolutamente normal o fato de cada dia eu estar com um cabelo. Eu também nunca conversei com as crianças da minha família sobre minha condição. Não sei se minhas primas já conversaram com elas e explicaram, mas o fato é que algo que, para muitos adultos hoje pode ser estranho ou “ruim”, para elas é absolutamente normal.

O simples fato de ter convivência com algo que seja tabu em sociedade já faz com que a percepção das crianças sobre aquilo seja normalizada. É claro que, o ideal, é conversar sobre, explicar, contar histórias e reforçar todos os pontos que elas precisam entender para que não se tornem adultos preconceituosos. Quando os pequenos têm diálogos comigo sobre isso, aí eu mostro, conto a minha história e reforço para eles que eu fiz do limão uma limonada: não só reforço tudo aquilo que é necessário, mas também mostro que devemos respeitar, acolher, ter empatia e que é muito legal ver alguém superando algo que antes machucava. Os resultados são sempre muito positivos!

Esperança para o futuro

Eu realmente espero que a nossa geração faça um bom trabalho de educação com as crianças para que o futuro do mundo seja menos cruel e preconceituoso. Devemos ensinar com amor, falar sobre temas que muitas vezes são complexos – isso é muito importante: temos que abordar tópicos como racismo, homofobia, machismo e etc, pois os exemplos, o ensinamento, os valores e caráter são construídos dentro de casa.

Hoje em dia há inúmeros materiais na internet que podem ser usados para ajudar na educação de crianças. Algumas de minhas seguidoras já relataram, por exemplo, que seus filhos e filhas assistiram meus stories do Instagram junto delas e entenderam a questão do meu cabelo. Você pode seguir pessoas gordas, pretas, LGBTQI+, deficientes e tantos outros perfis e ir conversando, mostrando, normalizando.

A sociedade é plural. Somos todos diferentes, com características únicas. Nossas histórias e vivências devem ser respeitadas e o preconceito só deixará de reinar quando conseguirmos educar as crianças com exemplo, amor e respeito, uns pelos outros. Elas são o futuro e eu realmente desejo que as próximas gerações vivam com mais paz e igualdade. Há beleza nas diferenças!

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