1 de dezembro de 2020. O ano mais caótico, bizarro e imprevisível está chegando ao fim. Sento para escrever já quase sem forças. A mente parece vaguear por campos nunca antes percorridos e a exaustão parece correr nas veias, navegando por todo o corpo. Paro para pensar em meu cansaço: é o acúmulo do que vivenciei nos últimos três anos.
Há uma espécie de bordão que diz que a vida vai repetir situações até que você aprenda a lidar com elas. Eu passei 7 anos presa em uma história que, de certa forma, só existiu em minha cabeça. E não porque eu era doida: mas porque, para a pessoa, o ato final da manipulação já era sabido desde o início. Ele me manteve ali, presa em suas garras por 7 anos, se alimentando de meus sentimentos, nutrindo seu ego, mesmo sabendo o meu destino final – desde o começo – era o descarte porque ele tinha outros planos.
Meus complexos de inferioridade, meu vitimismo, minha insegurança e a falta de amor próprio – aqui falo sobre um sentido muito mais amplo do que relacionado a padrões estéticos – sempre me fizeram atrair homens que me colocariam em situações extremas de vulnerabilidade e manipulação. Embora eu não tenha namorado com nenhum deles, foram relações amorosas de anos, extremamente tóxicas. Eu era praticamente mantida como uma refém para a satisfação dos egos alheios. Mas assumo aqui o meu papel de culpada: eu deixei.
O problema da vítima é que ela não consegue sair da trama do bandido quando o reconhece e, sinceramente, ela consegue reconhecê-lo até que logo. E, quando não o reconhece, é avisada pelos demais. Às vezes não quer enxergar; às vezes enxerga e não quer sair; às vezes simplesmente não consegue encontrar um caminho novo para percorrer e ficar ali, na toxicidade, recebendo migalhas, parece mais confortável.
Sim, eu fui esta pessoa por muitos e muitos anos. Neste exato momento sinto-me quase como alguém que está fazendo uma psicografia, observando o ser que digita do alto, trazendo um recado do Divino dizendo: Ei, já deu, né? Você já passou por coisas suficientes para ter aprendido o que precisava. É hora de romper com esses padrões repetitivos. É hora de se perdoar por ter se colocado nessas relações: você fez o melhor que pôde com a consciência que tinha naquele momento. E tudo é aprendizado e vai ficar tudo bem. Ninguém morre de amor e o sofrimento nos lapida para que nos tornemos mais fortes e sábias.
Eu tive inúmeras oportunidades de dizer não. Eu deveria e poderia ter dito não, mas quando você está envolta na manipulação e você é uma pessoa que tem a síndrome da boazinha somada ao vitimismo, você só consegue dizer sim. E as feridas vão se acumulando e abrindo cada vez mais. A exaustão que sinto no final de 2020 é o peso do fardo que carreguei pelos últimos 3 anos me dedicando a um amor que só existiu na minha cabeça – digo isso de forma figurativa, ok? Porque existiu, mas ele sabia, desde o dia 19/12/2019, quando voltou a me procurar, que ele se casaria com a pessoa com quem ele estava. Inclusive ele disse isso na “minha cara”, mas no momento em que eu deveria ter dito “então não temos mais o que conversar, siga seu caminho”, eu, entorpecida de amor, sonhando há dois anos com o retorno dele, só consegui me enxergar como alguém que luta até o último instante pela coisa mais preciosa de sua vida. Vesti a armadura e lutei, por praticamente mais um ano, por aquilo que eu acreditava ser a melhor coisa que já havia me acontecido.
Eu fui incapaz de dizer não. Eu não tive amor próprio suficiente para colocá-lo no lugar dele quando ele ressurgiu. Estava apenas entorpecida por minhas próprias ilusões amorosas de que, se ele voltasse, eu o conquistaria e viveríamos felizes para sempre. Dias atrás ele se casou, como sempre planejou, e eu fiquei aqui, recolhendo os cacos do imenso estrago que ele fez. Me perdi de mim, sofri uma das maiores dores da minha vida quando, ao finalmente conseguir mandá-lo embora da minha vida, no dia 25/08, percebi que ele não era tudo aquilo que eu enxergava. A imagem do príncipe encantado foi se desfazendo e eu fui, ao longo dos dias, enxergando o que eu tinha permitido que fizesse comigo. Ele foi cruel ao extremo, mas ele só foi cruel porque eu não fui capaz de barrá-lo.
Neste momento me encontro em uma situação atípica. É como se minha alma quisesse sair do corpo para descansar, para se renovar. É como se ela desejasse ir para um SPA ou um retiro zen para buscar a cura. A exaustão vai muito além dos limites físicos: é preciso, agora, acalmar. Descansar, curar, perdoar. Reconstruir. A dor não veio por perdê-lo, mas sim por eu ter me perdido de mim mesma, por isso o investimento em autoconhecimento, em desenvolver o nosso amor próprio é melhor e maior de todos. Se fosse hoje, com a consciência e experiência que adquiri, eu o teria mandado embora porque saberia prever, que a longo prazo, o estrago seria monstruoso e especialmente porque uma mulher que se ama, se reconhece e se admira jamais aceita migalhas.
Escrevo para o meu processo de cura. Escrevo porque as palavras me confortam. Escrevo para eternizar o aprendizado que tive e, principalmente, para dizer a mim mesma que a história foi repetida duas vezes. No total foram dez anos da minha vida dedicados a duas relações extremamente tóxicas e tristes em que eu me anulei completamente em busca do amor de outro. Preciso agora me reencontrar, me buscar, me curar, entrar em sinergia com a minha própria alma para que, em determinado momento, ao estar inteira, eu possa atrair alguém que realmente seja compatível com as melhores coisas que eu tenho para oferecer.
Aquela que me cura é a mesma mantenedora da fonte do amor abundante. Aquela que me cura é a mesma que quer me amar incondicionalmente. Aquela que me cura é a mesma que me acolhe e me acalenta. Aquela que me cura é o meu Eu superior.