Não sei você, mas demorei boa parte da vida para entender que a felicidade não era um estado de espírito único e total. Quando adolescente, tinha a ideia que seria plenamente feliz no dia em que fosse magra, como se eu fosse viver entorpecida por um estado de alegria constante em que nada poderia me abalar. Magreza definia a minha felicidade. Anos depois, somei a essa equação um relacionamento. Eu tinha que amar e ser amada para viver a plenitude do regojizo eterno.
Parando para pensar, mesmo desde criança, no fundo eu sempre soube que a felicidade não era algo único, linear e constante. O que acho que acontece, com muitas pessoas, assim como foi comigo, é que é mais fácil se apegar a essa fantasia do que racionalmente aceitar que a felicidade é fragmentada, já que aquela coisa grande na qual a projetamos não acontece – ou ainda não aconteceu.
Me lembro bem de muitas frustrações da minha vida e, também, dos muitos episódios de felicidade plena que já vivenciei. Entre alguns deles posso citar o dia em que experimentei uma calça jeans com stretch – a primeira de modelagem feminina que comprei e usei na vida porque, por ser gorda, só as masculinas me serviam e eu queria morrer com isso -; o dia em que recebi a carta do Rotary dizendo que eu iria para os Estados Unidos fazer intercâmbio e muitos momentos do intercâmbio em si; o dia em que passei pra fazer jornalismo na Unesp; quando recebi determinadas propostas de emprego e por aí vai. São muitos. Não poderia listar tudo aqui.
Fazia tempo, no entanto, que eu não chegava perto de sentir um pouco dessa felicidade plena por um período longo de tempo. Isso aconteceu agora, quando fiz minhas primeiras cirurgias reparadoras. Minha tia ontem disse: “- nunca vi alguém tão feliz saindo de um centro cirúrgico, mas também, só você sabe o que isso significa e tudo o que você passou”. É verdade. As fotos registradas por minha mãe não mentem: a minha felicidade era capaz de inundar o hospital. A alegria da realização, de mais uma grande etapa concluída, de um sonho para o qual eu me preparei pelos últimos anos, das mudanças que irá me trazer, me entorpeceram por dias e dias. É como se eu tivesse sido anestesiada pela felicidade, tomada de um sentimento indescritível, um mix de muitas sensações.
Foi maravilhoso sentir isso e ainda é. Embora o efeito já tenha amenizado, minha felicidade por realizar este sonho é imensa. Porém, com o passar dos dias, fui voltando a experienciar a alegria e a gratidão das pequenas coisas, como ver a minha nova vulva diante do espelho e até chorar de alegria; provar uma calça que nunca consegui usar na vida, pois a modelagem ficava horrível em meu corpo e tantas outras coisinhas que me fizeram lembrar que o mais gostoso de viver é poder desfrutar dos sentimentos que surgem quando conquistamos ou vivenciamos pequenas coisas que importam para nós.
Eu sei que a vida é um caos, mas não podemos fechar os olhos para as pequenas coisas. Sabe quando você tem um dia ruim e, de repente, o rádio começa a tocar sua música favorita e, por um instante, você se esquece dos problemas e é tomada por um sentimento bom que te recorda que vai passar, que nada dura para sempre? Agarre este momento e viva-o com a intensidade de uma vida, mesmo se ele durar 1 ou 2 minutos. Tudo tem a intensidade que você coloca, então deixe que a felicidade te entorpeça quando ela vier. Se renda a ela.
Celebre tudo que você tiver direito: desde a comida mais saborosa que você já tiver provado, o beijo da pessoa amada, usar uma roupa que você tanto queria, receber uma mensagem fofa do crush, um elogio do chefe até observar a chuva caindo no vidro em um momento de nostalgia. A felicidade existe e ela está também – e principalmente – nas pequenas coisas. Sua vida será mais leve e feliz se você observar tudo que acontece em um dia com um olhar mais otimista!