A escolha que não pude fazer

Acho que esse será o texto mais pessoal e difícil de escrever de minha vida. Algumas pessoas, que conhecem a história, conseguirão sentir o peso do que irei despejar aqui. Preciso fazer isso por mim, pelo difícil processo pelo qual estou passando e para tentar administrar em meu consciente toda a informação que me veio de repente, como se uma caixa cheia de surpresas tivesse sido derrubada no quintal de minha casa.

Sempre busquei pelo amor e sempre achei que ele fugia de mim. A sensação que eu tinha é que ninguém nunca me amaria porque talvez eu fosse chata demais, feia demais ou problemática demais. Enquanto todo mundo tinha alguém, eu tinha que deitar na cama e chorar com o travesseiro aquela dor de não compreender porque essas oportunidades não me apareciam de verdade. Mas hoje posso dizer que recebi a maior prova de amor que alguém poderia me dar:

O cara que eu mais amei, o meu grande amor, abriu mão da sua própria felicidade para que eu vivesse e não me tornasse uma morta-viva no auge da minha vida.

Precisei que essa frase viesse da boca de uma de minhas melhores amigas para entender a dimensão do que há dias meu cérebro tentava processar. Nunca parei para pensar que as mentiras eram todas calculadas, que as cenas horríveis que presenciei eram planejadas e que todo o ciúme era genuíno, apesar de aparecer em momentos específicos e isolados. Quando você nunca foi amada de verdade, você não consegue ver com os olhos da alma o que o seu entendimento físico não compreende.

Por três anos ele sentiu, ele fugiu, ele se entregou, ele viveu e fez a escolha por mim: ele escolheu me ferir em vida para que as feridas me dessem motivos para esquecê-lo e, assim, continuar vivendo, para que eu me permitisse novamente amar alguém um dia. Ele me conhecia de verdade e sabia que se vivêssemos nossa história, com sua morte, eu me tornaria uma morta-viva. Ele não me deu escolha, mas me deu a maior prova de amor de todas: de que quando o amor é de verdade, algumas pessoas são capazes de abrir mão da própria felicidade simplesmente para te ver feliz, mesmo que de longe. Ele abdicou do presente para garantir que eu tivesse uma chance de felicidade no futuro.

Já passei pela morte quatro vezes, mas perder a pessoa que você ama é um sentimento que não há como descrever. Claro que me dá raiva da vida e penso “por que não nos conhecemos antes, por que a doença, por que tudo teve que ser assim?”, mas foi assim que Deus quis que fosse. Hoje sou grata porque, embora não tenhamos tido a chance de viver essa história como gostaríamos, nem consigo imaginar como ele deu conta de tantas coisas ao mesmo tempo e ainda conseguiu tirar forças não sei de onde para ter a frieza de me poupar. Às vezes eu o chamava de egoísta. Hoje vejo que sua generosidade para comigo foi sem tamanho, sem limites.

Você tem o meu perdão, o meu amor infinito e a minha compreensão. Hoje consigo entender seus motivos, seus comportamentos, suas atitudes e não te julgo. Embora eu quisesse ter ficado com você, ter cuidado de você e ter feito tudo o que estivesse em meu alcance, acho que sua escolha foi mais sábia do que a minha teria sido. Não sei como sobreviveria após sua partida se você tivesse sido meu e você sabia disso. Você me conhecia muito bem.

Agora entendo o que você me disse quando nos vimos pela última vez e você questionou minha ida para Salvador, seguida de uma frase de impacto da qual não me esquecerei. Entendo também sua raiva quando fui pra lá pela primeira vez; entendo quando você quis me jogar para seu melhor amigo. Agora tudo faz sentido. E sabe o que eu não conseguia entender? Por que, após me fazer presenciar a cena que mais me magoou na vida, você olhou pra mim daquele jeito e pediu que eu te abraçasse e quando eu disse não, se enfiou no meu colo mesmo sem permissão dizendo “me abrace, por favor me abrace”. Isso nunca tinha feito sentido pra mim, mas agora eu sei. Você sempre dizia que o meu colo era onde você sentia a mais profunda paz e que se você pudesse, moraria nele.

Não vou conseguir colocar tudo aqui. É muito para administrar ao mesmo tempo, mas parece que sinto você ao meu lado, lendo cada linha que estou dissertando. Você lia tudo o que eu escrevia e acho que era o primeiro a ler os editoriais. Quis formalizar aqui, pra você, que eu vou ficar bem, que hoje te entendo e que você tem o meu perdão pela escolha feita. Você sempre terá um lugar mais do que especial em meu coração, sempre terá o meu carinho, a minha admiração e o meu amor.

Eu passei 29 anos pedindo a Deus que um dia um homem me amasse e me desse uma prova de amor. E foi apenas após sua morte que a vida me entregou essa caixa de surpresa, por meio de um anjo que ele deixou, que eu tinha sido amada a ponto de um homem abdicar de sua felicidade para não me deixar “morrer” após sua partida. Apenas agora, meses após sua morte, estou conseguindo processar a perda; ele não vai voltar, não vai me deixar mais DMs de bom dia, nem comentar nenhum de meus textos e nem brigar comigo por deixar indiretas na timeline. Ele se foi de verdade e a mim resta viver sabendo que ele queria que um dia eu encontrasse o amor novamente e que alguém me fizesse feliz como ele gostaria de ter feito.

Infinitamente, obrigada. A gente ainda vai se encontrar no infinito…

Paula

P.S.: Um agradecimento especial a Renan Botelho por ter chacoalhado a casinha pra ficha 1 cair e à Alyce Takai por chegar direto com uma voadora pras fichas que estavam na portinha despencarem de vez dentro da minha consciência. Amo vocês e agradeço a amizade que vai muito além da superficialidade da correria cotidiana <3

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