Fiquei 24h sem acessar as redes sociais e, quando acessei meu Facebook ontem à noite, vi várias postagens falando sobre a nova campanha da C&A. Fui ler todos os posts das blogueiras que se manifestaram para entender o que estava acontecendo. Embora muita gente já tenha se posicionado e explicado muito bem qual é o problema da nova publicidade, venho também endossar o coro porque essa é a minha causa, a minha militância e porque a marca precisa entender que não estamos mais brincando de representatividade: hoje ela é real e ela pode acontecer de maneira fidedigna. A peça publicitária criada pela a AlmapBBDO só comprova o que eu, agora falando como profissional de comunicação e não como blogueira, tenho falado exaustivamente: não se aborda uma causa sem realmente entender o que ela significa, sem ter alguém na equipe de criação que sinta na pele o que é passar por aquilo, por isso diversidade é tão importante no mercado de trabalho, inclusive. Seria possível criar uma campanha para gays, por exemplo, se a equipe for totalmente heterossexual? Eles podem até imaginar como é, o que eles passam e enfrentam, mas imaginar é muito completamente diferente de vivenciar e sentir na pele o dia a dia do que a sociedade reproduz.

Essa onda de representatividade agora é cool para a publicidade porque todo ser humano gosta ou gostaria de se sentir representado, sim, mas para abordar qualquer aspecto de representatividade antes é preciso entender e fazer parte da causa, senão o propósito principal não se cumpre, simples assim. Este ano participei de uma campanha da Dove que foi brilhantemente executada, pois eles conseguiram escolher pessoas que realmente viviam e militavam por uma causa. Repito: imaginar é muito diferente de vivenciar na realidade todos os dias. Eu nem entendi, em primeiro lugar, por que a C&A colocou uma modelo plus size, a chamando de gorda na campanha, se ela não vende roupa para gordas! Quando morava em São Paulo eu até encontrava, em algumas lojas – não todas, que fique bem claro -, uma arara com peças de tamanho especial. A grade ia até o 54 e a modelagem era pequena, como se pode imaginar. Me lembro que na época em que a primeira coleção da Preta Gil foi lançada, eu usava manequim 48 e tive que experimentar umas camisas 54 porque os outros tamanhos não serviam. Um pouco absurdo, né?

Nem preciso ir muito longe para falar sobre marcas que querem parecer legais falando de representatividade porque temos isso dentro do próprio mercado plus size. Acho que sou uma das blogueiras que mais critica e questiona o padrão das modelos escolhidas para a maioria das campanhas e catálogos das marcas, principalmente de lingerie, em que elas aparecem perfeitas, sem uma dobrinha ou marquinha de celulite ou estria, já percebeu? É aquela sensação de “quero seu dinheiro, mas tenho vergonha de te vestir”. Você vai comprar uma roupa e na modelo parece perfeita, pois ela não tem barriga, tem corpo ampulheta e tudo ficou lindo nela, mas quando chega na sua casa é completamente diferente. Diversidade, minha gente! Por que usar sempre o mesmo padrão de modelo se os corpos gordos são tão diferentes? Por que não ter mais de uma modelo para que a cliente gorda consiga ter uma noção mais real de como a roupa ficará nela? Isso tudo está criando um padrão para as gordas, algo que eu não aceito de jeito nenhum. Vi tanta gente ontem comentando que “se essa modelo é gorda, então eu sou o quê?” nos posts referentes à campanha e deixa eu te dizer: isso não acontece porque a campanha da C&A foi polêmica, acontece toda vez que uma marca plus size usa uma modelo que veste 44 ou 46. Entendem agora porque questiono tanto a indústria de moda plus size sobre as modelos escolhidas? Eu não aguento mais ver modelos ampulheta que são apenas curvilíneas tentando vender roupa pra GORDA. Sim, GORDA: aquela que tem banha que pula pra fora do jeans, rolinho nas costas, bração, peitão, bundão, barrigão, coxão e etc; aquela mulher que veste uma saia ou um vestido e fica com aquela marca de barriga, sabe? Essa gorda. É pra ela que essas marcas vendem, pois é ela quem precisa desesperadamente de roupas adequadas, então compra em lojas plus size, mas é ela que é renegada porque não tem o “padrão gordo aceitável” que se estabeleceu. Eu fico pra morrer, sério!

Por que a C&A falhou?

Vamos entender uma coisa, de uma vez por todas: nem toda plus size é gorda. Plus size foi um termo criado na gringa para se referir aos tamanhos maiores, que normalmente vão do 46 em diante. A maioria das grades regulares contempla do 36 ao 44. Você pode vestir plus size por várias razões: por ser bem alta, por ter ossos largos e ser grandona, por ter bastante quadril ou seio, mas isso não significa, de forma alguma, que a mulher seja gorda obrigatoriamente. A modelo da campanha da C&A não é gorda: ela é curvilínea, como ela mesma se intitula. Nem vou entrar no mérito do post que ela mesma fez falando de IMC e de definição de “gordo” no dicionário porque sério, eu não sabia se ria ou se me estapeava, mas não só a campanha da C&A como muitas outras marcas estão aí, o tempo todo, fazendo mulheres se sentirem erradas, feias, problemáticas e se questionando o que ela é se aquela modelo é considerada gorda. É irresponsável, até! Isso causa uma série de neuras, distúrbios alimentares, crises de autoestima e até depressão. Raras as marcas que sabem trabalhar representatividade e empoderamento de verdade. Eu não vou nem me aprofundar porque não é minha área de vivência e conhecimento, mas também vi muitas mulheres negras questionando a modelo negra que a C&A escolheu porque a menina tem a pele clara e traços mais finos. É tipo o lance da Beyoncé que é negra, mas aí todo mundo ama porque “nem parece que ela é negra”… Olha, é absurdo e eu entendo também as meninas negras que se posicionaram porque sim, parece que tem o padrão aceitável pra gorda, pra negra, pro gay, pro trans… Rótulos, padrões: a sociedade não consegue se desprender dessa fórmula doentia, né? Talvez porque seja ela que faça o capitalismo girar porque né, tem sempre algo de errado com você, então você tem que consumir pra melhorar e chegar naquele degrau da escada onde te veem com bons olhos. Banana pra você, sociedade!

Eu espero que essa gafe da C&A faça a loja repensar muita coisa, muito mesmo, inclusive as araras de roupas deles. E repito aquilo que eu sempre digo: sábio é aquele que aprende com o erro do outro, então que as próprias marcas plus size estudem esse episódio para entender o que é representar a mulher gorda e o que ela quer e precisa. Quer parecer bacana? Antes de chamar uma agência de publicidade pra dar uma gafe dessas, mude primeiro a sua marca. Produza roupas, entenda o que esse público quer e precisa porque, deixa eu te dizer: tá cheio de gorda por aí que adoraria torrar uma boa grana comprando roupas bacaninhas na C&A, mas não tem e quando tem é feia! Tem tanta gente competente nesse mercado que vocês poderiam consultar e fazer algo pra mudar, mas não, continuam apostando nas velhas fórmulas e errando. Se for pra brincar de representatividade, que tal fazer isso de forma real? Aprendam a diferença do que significa ser gorda e ser plus size e entendam, de uma vez por todas, que não dá pra trabalhar diversidade e representatividade se isso não é uma verdade dentro do seu negócio. Se você não oferece meu tamanho na sua loja, você não me representa. Simples assim.

Leia mais:

C&A e a sua versão gorda de Taubaté

+ Carta aberta à C&A

+  C&A e a propaganda enganosa: close erradíssimo

+ C&A se envolve em polêmica em campanha com modelo plus size

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Um comentário

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Também reprovei a campanha.

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