Imagine que você está em uma feira. Em vez de comprar chuchus, tomates e batatas para alimentar as pessoas, você irá comprar adjetivos. Você olha a sua volta e começa a pegar as palavras: gorducha, alta, magricela, orelhuda, baixinha, bonita, inteligente, idiota, feia, dentuça, nariguda, divertida e etc. Você volta para casa com a sacola cheia e guarda alguns termos em sua dispensa e resolve distribuir os outros. Para as amigas escolhe a dedo os mais bonitos, mas aí sobram os feios, os que ninguém quer. No entanto, é necessário repassá-los, pois você não tem onde guardá-los e aí se lembra de quem os “merece”.
Obviamente temos mais afinidade com algumas pessoas ao longo de nossas vidas e, pelo meio do caminho, sempre aparecem certas pedras em nosso sapato. Dessa vez vamos dizer que todas essas pedras são femininas, ok? Elas são a sua ex-sogra, a sua chefe, aquela menina do apartamento de cima que tem o cabelo lindo, a atual namorada do seu ex, a moça que está no ponto de ônibus com uma calça justa e tudo em cima… Todas elas podem fazer uso de um dos adjetivos que sobraram em sua sacola, afinal, cada uma delas têm algo que te incomoda.
Quando mulheres se sentem incomodadas, viram verdadeiras leoas dispostas a atacar quem invade seu território e, vamos combinar: o espaço é grande! Ele inclui a sua vida amorosa, profissional, o seu círculo de amizades e outros aspectos que propiciam o contato com outras pessoas do sexo feminino. Ao se sentir minimamente ameaçada, a mulher se transforma e começa um ritual quase que antropológico de distribuição desses adjetivos: praticamente voltamos ao período da inquisição apontando o dedo e queimando sem dó e com julgamento precário a nossa similar. Porque xingar tornou-se hábito, porque hoje todo mundo é juiz e tem uma sentença.
“Aquela gorda nojenta.”
“Aquela magra que só cachorro gosta porque é osso.”
“Aquela vesga.”
“Aquela cara de cavalo.”
“Aquela idiota de cabelo desgranhado.”
Quantas vezes você ouviu uma pessoa conhecida fazendo isso e, pior, quantas vezes você fez isso? Eu já fiz muitas e, confesso, precisei fazer com que uma menina virasse um monstro tão grande dentro da competição ilusória que criei em minha mente para que eu parasse para analisar o quão feio, infantil e retrógrado era o meu pensamento e as minhas atitudes. Me senti como uma criança condicionada a um comportamento e sim, essa reação é condicionada, pois a sociedade nos ensina a agir e pensar dessa forma. Estou dizendo tudo isso porque se você parar para observar as conversas no Twitter, por exemplo, todos os dias vejo magras atacando gordas e gordas atacando magras. Pra quê? Enquanto mulheres continuarem se violentando – e nesse caso nem é uma briga corporal, é pelo simples prazer de xingar – todo o progresso que foi conquistado em termos de quebra dos padrões retrocederá. É muito triste!
Falando sobre gordas, demoramos tanto tempo para conseguir um pouco de espaço e respeito na sociedade e na mídia que, agora que isso está acontecendo aos poucos, o que mais vejo é gente que se diz “envolvida no movimento” xingando quem é magra em tom depreciativo, usando essas comparações de que osso é para cachorro e etc. Precisamos mesmo reforçar que apenas um padrão é o “certo”, o “aceitável”? Não podemos simplesmente tentar mostrar, juntas, para a sociedade que há beleza em todas as formas e que existe espaço para todos os tipos de pessoa? Quando falamos de beleza, não existe certo ou errado. Existe o que atrai um e outro. Se todo mundo gostasse da mesma coisa, estaríamos perdidas! Gordas, magras, baixinhas, negras, japonesas e etc: TODAS TÊM A SUA BELEZA e características que fazem da diversidade algo bonito que deveria ser apreciado e respeitado. Não somos Barbies e não saímos de fábricas: somos pessoas!
Por favor, parem! Denegrir a imagem de outra mulher ou usar adjetivos ou termos pejorativos para se referir a outras pessoas é péssimo e só faz com que você atrase todo um lindo processo de evolução que está tentando acontecer, não só na sociedade, mas DENTRO DE VOCÊ! Hoje tenho visto muito mais gordas serem preconceituosas com quem quer emagrecer ou com quem é naturalmente bem magra, pois é como se quisessem uma revanche de tudo o que ouviram ao longo dos anos. Vai adiantar alguma coisa? Isso é triste demais. Já cansei de dizer que o adjetivo tem o peso que você dá a ele. Gorda é apenas um termo e só será ofensivo se você deixar que ele te ofenda. Ele define quem você é? É ele que molda o seu caráter, que expõe os seus valores? A resposta TEM QUE SER NÃO porque você não é um corpo: você é um ser humano dotado de corpo e alma e a sua alma só terá o peso do seu corpo se você a lotar de sentimentos ruins. Ela deve ser leve como uma pluma.
O dia em que você não sentir mais a necessidade de depreciar uma outra mulher porque sente que ela é mais bonita que você, ou ganha mais, ou tem um namorado mais bonito que o seu, ou tem um cabelo maravilhoso, você terá evoluído bruscamente e pessoas assim passam esses ensinamentos adiante. Sentimentos ruins fazem muito mais mal a nós mesmas do que às pessoas para quem você os deseja, então pare de contaminar a sua essência. Em vez de ficar se comparando com outras mulheres, que tal reforçar suas qualidades e buscar melhorias onde é possível mudar? Não vivemos mais na época da inquisição, não estamos caçando bruxas, a vida não é um tribunal e o seu dedo jamais deveria se levantar para usar características físicas ou comportamentais dos outros para que você se sinta bem. Quando gordas respeitarem magras e magras respeitarem gordas sem que uma precise depreciar a outra para se sentir valorizada, aí a sociedade terá dado um grande passo para a evolução e essa mudança depende de cada uma de nós!
5 comments
Flávia
Muito bom texto, Paula.
Isso realmente é bem complicado.
Eu ainda acrescentaria que esse é um mal da humanidade, do ser humano enquanto pessoa que julga e esquece de olhar as próprias características… As mulheres acabam usando muito mais esse joguinho, mas no mundo masculino e entre homens e mulheres há também uma constante nesse sentido.
O fato é que as pessoas deveriam se respeitar mais, julgar menos sem ter conhecimento das situações pelas quais passam as outras pessoas. 🙂
Divulgarei tb! Como a Kalli comentou, acredito que todas as pessoas devam ler esse texto!
Grande beijo!
ISIS LEAL
Que texto maravilhoso !!! Paula muito prazer em te conhecer vc é maravilhosa é pensamentos como o seu que temos de passar adiante !!! Que bom encontrar alguém que pensa como eu. Eu sou gordinha tenho 29 anos,já sou mãe de duas crianças e estou no manequim 48.Mulheres tem de parar de ficar ofendendo umas as outras eu graças a Deus não tenho raiva de quem é magra nem de quem tem cabelo maravilhoso sei reconhecer e admirar sem invejar ,é muito melhor sermos amigas umas das outras.Nossa eu amei de verdade esse blog, Parabéns Paula!!!!
Eduardo Arauju
Digno de ser lido não uma vez mais 100 vezes até entrar na caixola, para que quando cometêssemos tais absurdos pensarmos nestas palavras sabias e prontas para serem discernidas e colocadas em pratica. Eu como precursor no Brasil no segmento Miss Plus SIZE, me sinto muito triste quando vejo a soberba, o egocentrismo e a vaidade excessiva sobrepor a oportunidade, a visibilidade, a auto estima e a vontade de assumir que é bela que é maravilhosa e que esta VIVA. Mas infelizmente não conseguimos mudar o mundo e nem as pessoas, quem sabe um dia quando as pessoas tiverem com seus corações abertos a ouvir e a mudar Mas podemos refletir pelo menos em como eu estou sendo visto por A ou por B e se eu estou fazendo com o meu semelhante o que eu eu gostaria que fizesse comigo. (Denegrir a imagem de outra mulher ou usar adjetivos ou termos pejorativos para se referir a outras pessoas é péssimo e só faz com que você atrase todo um lindo processo de evolução que está tentando acontecer, não só na sociedade, mas DENTRO DE VOCÊ!) Perfeito …..Parabéns, parabéns e parabéns..Sem muito o que falar apenas aplaudir. Bjo no ♥ de todas Eduardo Arauju
elena
até que enfim alguem escreveu sobre isso, diariamente vejo vários grupos plus size postando coisas ofensivas contra as magras, teve um grupo que postou que homem que casa com mulher magra merece ser corno, isso é nojento!!! Conheço MUITAS obesas que levantam a bandeira de que se deve respeitar o padrão delas mas sentam ao sofá e falam mal de todas as mulheres que aparecem na tv e que elas veem, mas se o mesmo ocorre com elas logo vira gordofobia. Assim como a gordinha tem todo o direito de achar mulheres magras feio muitas mulheres magras, sou magra, tenho cuidados com a minha alimentação, faço atividade física mas não encho o saco de ninguém, sou chamada de anoréxica, fútil, superficial, obsecada e adjetivos afins, se a pessoa bebe, come em demasia, pesa 200 kg não me importa, eu não desejo isso pra mim mas não encho o saco de ninguém como enchem o meu. Ao invés das mulheres se unirem contra todos os estereótipos parece que a maioria decidiu travar uma guerra umas contra as outras, todo mundo fala de padrão… 2° pesquisa recente + da metade da população está acima do peso, 99% das pessoas que conheço estão um pouco ou muito acima do peso, então o padrão é esse, quem tá fora do padrão não é o gordo é o magro, e ser magra e ter certos cuidados parece que faz as pessoas jogarem em cima de mim todas as suas frustrações… quem tá fora do padrão sou eu, e nem sou tão magra assim tenho 1,60 e peso 55 kg, até o fato de eu não ter barriga vira arma pra me ofenderem, dizerem que eu não como, que sou louca etc…
nem
A mulher que mais incomoda ainda é a independente, seja qual for o tipo físico.